Sofia alternava ao lado da sogra as noites de
sentinela, junto ao leito do enfermo Boris.
Nesta noite em particular contemplava o enfermo que ardia em febre e lembrava-se
dos primeiros dias... Os dias em que conviveu com aquele rapaz que já conhecera
com aparência de debilitado na saúde.
A lividez das faces de Boris, bem como seu físico e
até mesmo sua maneira de falar, como que sempre cansado por natureza, levava
qualquer um a deduzir logo tratar-se de um rapaz acometido de alguma
enfermidade séria.
Caia a noite e, dia após dia, sogra e nora
alternavam-se à cabeceira do jovem enfermo que transvaliava, e jovem ainda,
principiava a abandonar a vida.
Sofia evitava manifestar à sogra a temeridade da perda
do marido que considerava próximo ao fim. Esta por sua vez buscava não
demonstrar à nora o desespero que invadia sua alma, prevendo perder o único
filho.
E assim as duas mulheres arrastavam os dias e varavam
as noites, numa ânsia contínua de ressuscitar ainda em vida o pobre Boris de sua
enfermidade.
Até que se deu o inevitável. A consumação da agonia do
rapaz que transcorreu meses em seu leito de enfermo. A mão misteriosa da morte
recolheu seu último suspiro, e o entregou de volta a Deus.
Sofia e sua sogra cobriram-se de luto. E prantearam
solitárias por tempo vasto aquele que para longe delas se fora, para nunca mais
voltar.
E latejou no coração de ambas como um princípio de
solidão, impossível de dissolver-se. Impossível de ser compartilhada.
Ajoelhadas aos pés do leito onde jazia o corpo inerte,
debulhando-se em lágrimas, cada uma das duas principiaram a deslizar as contas
do terço, intercedendo junto a Deus, pela alma daquele que tão cedo as deixava
para trás.
Deu-se o findar do tempo necessário para que se
conduzisse o corpo do jovem à sepultura.
E seguiu então o féretro pelas ruas. E cortejo solene
se fez. A dor estampada nas faces da viúva e sua sogra, revestidas ambas pelo
negro do luto, carregando nas mãos o rosário, emocionou a todos que em
procissão fizeram questão de dar o último adeus ao jovem.
O sol não brilhava. O céu parecia conivente com a dor
das duas mulheres; senão negro, cinza.
Desceu à cova o caixão, com a cruz de Cristo por sobre
a tampa do ataúde.
Sofia e sua sogra voltaram as costas e, penitentes em
sua dor, regressaram para casa.
Selaram a porta do quarto de Boris, como um sinete
encerra um templo sagrado. E o tempo? O tempo encarregou-se de sorver do
coração das duas mulheres o gotejar lento daquela dor. Daquela duplicidade de
angústia e amargura que envolveu por anos o coração de ambas.
FIM
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